Imagem Logo A implantação de sistemas agroflorestais no Sul do Brasil: uma conversa à sombra da árvore

A implantação de sistemas agroflorestais no Sul do Brasil: uma conversa à sombra da árvore

Moacir José Sales Medrado[1]; Renata Dantas Medrado[2]; Marcelo Ricardo Dantas Medrado[3]

O uso de sistemas agroflorestais é algo recente no sul do Brasil?

Não. Nas quatro últimas décadas, o desequilíbrio ambiental causado pelo modelo simplificado de agricultura fez os cientistas buscarem sistemas alternativos de fazer agricultura, sustentáveis e capazes, em alguns casos, de recuperar áreas degradadas por mau uso agropecuário. Os sistemas agroflorestais – SAFs passaram a ser um dos sistemas alternativo de agricultura no Brasil. Seu primeiro registro científico no Brasil foi feito em 1962 na região Sudeste.

Na década de 70 os SAFs passaram, a fazer parte das propriedades privadas e das estações experimentais na Amazônia, no Nordeste, no Sudeste e no Sul do Brasil, incentivados por ações da Embrapa Amazônia Oriental, da Ceplac, da Universidade Federal de Viçosa - UFV e da Embrapa Florestas, respectivamente. Na época, predominavam sistemas silviagrícolas de baixa complexidade (poucas espécies) e, também, sistemas agrossilvipastoris, aplicados a pequenas propriedades familiares (Amazônia e Semiárido) e a empresários (Sul e Sudeste). Eles eram desenhados quase sempre por pesquisadores e testados nas estações experimentais (exceção a alguns trabalhos implantados e conduzidos nas grandes empresas florestais).

No sul do Brasil, dois sistemas de produção poderão ser considerados SAFs autóctones pois já eram praticados pelos agricultores desde o início da implantação de sistemas agroflorestais em nosso país: erva-mate asssociada com cultivos agrícolas nas entrelinhas; e bracatinga associada a cultivos agrícolas.

Com o tempo, a pesquisa tradicional no início e participativa nos últimos anos foi incorporando novas alternativas com ênfase nas duas principais espécies florestais introduzidas: pinus e eucalipto. Os plantios de eucaliptos e pínus associados com culturas agrícolas passaram a ser um lugar comum, até mesmo porque propiciam uma diminuição nos custos de implantação das espécies florestais e permitem um fluxo de caixa mais interessante.

As discussões a respeito de complexidade biológica dos SAFs tem feito com que no Brasil e em especial na região sul – onde os SAFs eram compostos por apenas uma espécie florestal e uma agrícola – surja um novo esforço de ampliação da complexidade biológica destes sistemas.

Sistemas mais complexos, de alta diversidade biológica, tem sido construídos e utilizados por pequenos agricultores e – por exemplo em Barra do Turvo -  hoje se constituem em alternativas para recuperação de áreas de reserva legal. São portanto, “sistemas ponte” entre áreas desflorestadas e reflorestamento. Vale ressaltar, também, a complexação que vem sofrendo o sistema agrossivicultural de erva-mate com a introdução de um conjunto de espécies florestais nativas para sombreamento das erveiras antes plantadas a pleno sol.

Um outro tipo de sistema agoflorestal teve um crescimento bastante significativo na região sul: o silvipastoril. Hoje, só no estado do Paraná existem quase dez mil hectares deste tipo de sistemas. Experiências que têm servido de ferramenta indutora para o desenvolvimento desta tecnologia em todo o Brasil. Hoje, os sistemas silvipastoris (pastagem e gado) e agrossilvipastoris (agricultura, pastagem e gado) constituem-se em uma das principais ferramentas da nova estratégia de como fazer agricultura sustentável: a Estratégia Integração Lavoura, Pecuária e Floresta – ILPF.

Quantos agricultores aderiram a esse sistema?

Não se tem um número exato mas pode-se estimar que das 180 mil propriedades que trabalham com erva-mate no Brasil cerca de 50% utilizam-se do plantio em sistema silviagrícola.

Do ponto de vista silvipastoril, somente no estado do Paraná cerca de dez mil fazem pecuária moderna com ênfase em sistema silvipastoril ou agrossilvipastoril.  

Ouvimos falar de sistema agroflorestal principalmente no Norte do Brasil. Em que tipos de áreas esse sistema é viável no sul do país?

Os sistemas agroflorestais – SAFs podem ser utilizados em várias áreas no sul do Brasil. Principalmente, com relação a: erva-mate sombreada; sistema agroflorestal da bracatinga; sistemas agroflorestais com ênfase em fruteiras arbóreas; sistemas sivipastoris ou agrossilvipastoris;  e sistemas agroflorestais sucessionais de alta complexidade biológica que servem para recomposição de Áreas de Reserva Legal – RL e para produção sócio-econômica-ambiental sustentável. Estes deverão ser os principais tipos de SAFs da agrofloresta no Sul do Brasil.

Que segmento de produtor poderá ser mais beneficiado com o uso de SAFs?

Vale ressaltar que sendo o Sul do Brasil a região que mais sobressai na produção familiar e considerando-se a grande aderência dos sistemas agroflorestais à agricultura familiar, é de se esperar que os SAFs tenham um grande crescimento neste segmento da agricultura do Sul. Os Programas Florestais dos Estados do Sul do Brasil, em especial os Programas das metades Norte e Sul do Rio Grande do Sul, os Programas de Fomento Florestal das empresas do setor florestal e o programa de substituição do fumo, em especial no estado do Paraná, serão, sem dúvida, os motores do desenvolvimento de SAFs no Sul do Brasil, no segmento agricultura familiar.

No segmento de médios e grandes produtores os grandes indutroes deverão ser o Programa Florestal para a Metade Sul do Rio Grande do Sul e o Progrema de Integração Lavoura, Pecuária e Floresta – ILPF do Ministério da Agricultura.

Existe algum tipo de programa para a região que incentive essa prática entre os agricultores?

Sim. Desde o Plano Safra 2005/2006, estabeleceu-se no Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar a linha Agroecologia que permite o financiamento de Sistemas Agroflorestais como ferramenta agroecológica. A linha Pronaf Agroecologia. Esta linha foi criada em consonância com as diretrizes do Programa Nacional de Apoio à Agricultura de Base Ecológica nas Unidades Familiares de Produção. Ela incentiva o produtor a mudar seu modo de produção para um modo mais sustentável. A partir do Plano Safra 2007/2008 o Governo Federal, também, promoveu maior direcionamento do PRONAF-Floresta para atividades agroflorestais.

Vale ressaltar também que o PRONAF financia a juros compatíveis com a agricultura familiar a atividade de Agroindústria Familiar, sem a qual a utilização dos sistemas agroflorestais fica comprometida.

Vale ressaltar, também, dois importantes programas do Ministério da Agricultura Pecuária e Abastecimento – MAPA, que estão incluídos no Plano Safra: o Programa de Plantio Comercial e Recuperação de Florestas (Propflora) e o Programa de Estímulo à Produção Sustentável (PRODUSA).

O Propflora financia, além da implantação e manutenção de florestas destinadas a fins econômicos, a recomposição e manutenção de áreas de reserva florestal legal sendo portanto uma possibilidade para financiamento de sitemas agroflorestais de alta complexidade biológica: os sistemas florestais sucessionais também chamados de agrofloresta sucessional.

O Programa de Estímulo à Produção Agropecuária Sustentável (Produsa), concede aumento de até 15% em crédito de investimento para o produtor que tem em sua propriedade área de reserva legal ou ainda que esteja implementando plano do Programa estabelecido pelo Governo Federal através do Ministério de Agricultura que incentiva a implantação da Estratégia Integração de Lavoura, Pecuária e Floresta - ILPF. Assim sendo, principalmente para médios e grandes empresários, constitui-se em uma possibilidade tanto para financiamento de agroflorestas sucessionais visando a recuperação de Reserva Legal quanto para sistemas agrossilvipastoris e silvipastoris que são ferramentas básicas para a estratégia ILPF do MAPA.

Do ponto de vista do financiamento privado existem sistemas de fomento florestal que apóiam com assistência técnica e até mesmo mudas, a implantação de sistemas agroflorestais de baixa complexidade biológica (consórcios agroflorestais) nas propriedades de seus fomentados.

Quais são as espécies cultivadas nesse sistema?

Existem várias espécies florestais arbóreas e arbustivas nativas ou introduzidas que são, atualmente, utilizadas em sistemas agroflorestais comerciais, de baixa complexidade na região Sul do Brasil. Dentre elas, destacam-se: grevílea, eucalipto, pinus, acácia-negra; palmiteiro; pupunha; erva-mate; seringueira; bracatinga; pinheiro-do-paraná. Outras apesar de indicadas pela pesquisa, ainda são pouco utilizadas nestes sistemas; É o caso do guanandi, do louro-pardo, da canafístula e do timbó como espécie adubadeira.

Vale ressaltar que hoje, com o advento dos sistemas agroflorestais sucessionais o número de espécies nativas incluídas em sistemas agroflorestais é enorme, com destaque para bracatinga, pinheiro-do-paraná; angicos; canelas; ipês; jequitibás; canjarana; pau-jacará; aroeira; dentre outras. Para aqueles que desejam selecionar espécies nativas para composição de sistemas agroflorestais recomendamos a coleção de livros da Embrapa Florestas de autoria do Pesquisador Paulo Ernani Ramalho Carvalho denominada Espécies Florestais Brasileiras.

Quanto a espécies agrícola de ciclo curto são utilizadas as mesmas semeadas em sistemas monoculturais: soja, feijão, milho, trigo. Em alguns casos têm sido observados plantios de espécies medicinais de ciclo curto entre aléias de espécies arbustivas ou arbóreas. Um exemplo interessante disso são os plantios de plantas medicinais em aléias (entre linhas) do timbó que é uma espécie que funciona como adubadeira quando mantida sob poda. O material de sua poda serve como adubo para as plantas medicinais ou para hortaliças. Maiores informações poderão ser obtidas com o pesquisador da Embrapa Florestas Amilton João Baggio.

Para a implantação de pomares agroflorestais e sistemas agroflorestais com ênfase em palmeiras têm sido utilizadas inúmeras espécies, com destaque para: laranjeiras; jaboticabeiras; butiazeiro; goiabeira-serrana;  araçazeiro; pitangueira; palmiteiro e pupunha. Há no entanto, potencial para inúmeras outras espécies nativas como uvaia, cambucá, guabirobeira, guabijú, etc.



[1] Engenheiro Agrônomo, Doutor em Agricultura pela ESALQ/USP: e-mail: moacir@mcagrofloresta.com.br

[2] Engenheira Agrônoma, Mestre em Integração Lavoura e Pecuária pela UFPR. E-mail: renata@mcagroflorestal.com.br

[3] Engenheiro Agrônomo, em curso de especialização em geoprocessamento; email: marcelo@mcagroflorestal.com.br

 

 

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